Ao narrar os mistérios da vida de Jesus, os Evangelhos anotam que a seu lado, frequentemente, se encontra sua Mãe, de tal maneira que, na perspectiva dos Evangelhos, fica difícil falar da pessoa de Jesus, deixando de fora o mistério da pessoa de Maria. Na verdade, sem a presença de Maria qualquer leitura sobre Jesus de Nazaré, o Verbo de Deus feito homem no seio da Virgem, ficaria, de alguma maneira, incompleta.
Na vida de Jesus, a presença de Maria comparece como a presença de Mãe e, por isso, como uma presença importante. Dessa anotação evangélica desprende-se uma espiritualidade mariana da presença. Maria é a Mulher que se faz presente: faz-se presente junto a Deus, através de sua atitude orante e fiel; faz-se presente na totalidade da vida de Jesus; e, por fim, presente na vida do próximo. Assim, apresenta-se como pessoa que leva a cumprimento a vocação humana em suas três dimensões fundamentais: de filha, de mãe e de irmã – como mulher. Ao dizer “eis aqui a serva do Senhor” (Lc 1,38), realiza sua vocação filial. Quando “deu à luz seu Filho” (Lc 2,7) e o acompanhou até à Cruz, realizou sua vocação de Mãe. Quando “pôs-se a caminho para a região montanhosa, dirigindo-se apressadamente” à casa de Zacarias e Isabel (cf. Lc 1,39-40), realiza sua vocação de irmã.
Essa disponibilidade em fazer-se presente é aquilo que torna Maria uma pessoa importante, ou seja, uma pessoa capaz de deixar uma marca positiva, porque amorosa por onde passa. Por isso, ao vê-la, Isabel foi levada a proclamar: “Tu és feliz” (Lc 1,42).
Dessa maneira, o Evangelho de Lucas apresenta, através de Maria, uma espiritualidade da realização humana, que se dá quando saciamos nossa sede de importância. De fato, todo ser humano busca tornar-se um ser importante, ou seja, um ser, cuja vida tenha significado, que não simplesmente passe pela vida, mas que deixe sua marca, sendo capaz de fazer-se memória, recordação, como expressa o sentido profundo da palavra importância que, originariamente, quer dizer trazer para dentro.
É importante quem tem a capacidade de entrar no coração das pessoas e, entrando, instaura aquele elo gerador de uma comunhão profunda que cura todo sentimento de desconforto humano e solidão. Realmente, o nosso maior medo é o de cair no esquecimento, o medo de não ser recordado, o que seria uma condenação. É por isso que na Oração Eucarística II nós rezamos: recordai-vos, ó Pai, da vossa Igreja espalhada por toda a terra. Nesse momento estamos recordando misticamente, trazendo para o coração Deus, pedindo que Ele não deixe caídos no esquecimento tantos que estão longe, mas que se re-corde (recordare, em latim), pois ser recordado é ser também salvo. A recordação é uma salvação.
Diante da saudação de Isabel, a própria Maria, no Espírito, disse que seria recordada por “todas as gerações” (Lc 1,48). É claro que o motivo da sua importância, que lhe permite ser recordada pelas gerações futuras, foi o que Senhor realizou nela. Todavia, o Senhor só pôde realizar essas grandes coisas porque Ela se dispôs, fez-se presente, fez-se serva, isto é, obedeceu ao Senhor que pede uma única coisa: Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos. A obediência a este mandamento se traduz em forma de serviço, pois quando amamos servimos e quando servimos amamos. Maria fez exatamente isto quando se fez presente e disse: “Eis aqui a serva do Senhor”. Torna-se também serva de toda pessoa humana e, pelo serviço, tornou-se Senhora de todos os povos. Assim, sua pessoa revela que é pelo nosso serviço amoroso que adquirimos a importância que buscamos e nos eternizamos no coração de Deus e no coração do próximo, através da recordação que nos faz tão bem.
Pe. Antonio César Maciel Mota
Pároco da Paróquia São João Batista em Rio Claro
Docente do Curso Diocesano de Teologia