O Evangelho segundo Mateus é o mais judaico dos evangelhos. Ele surgiu num grupo de comunidades de discípulos que foi expulso da sinagoga e teve que se organizar nas casas de seus membros. Eram homens e mulheres que acreditavam que Deus se revelou totalmente em Jesus e assim liam o Antigo Testamento sob a luz de Cristo. Foram incompreendidos pelas comunidades rabínicas (fariseus), expulsos e perseguidos.
Foi escrito durante os anos 80 d.C., quando as comunidades perseguidas enfrentavam duras críticas dos fariseus que acusavam os cristãos de abandonarem a Lei judaica para seguir as ideias de um subversivo que morreu crucificado. Diante da desistência de muitos discípulos que voltavam para as sinagogas, as comunidades relembraram a prática e os ensinamentos de Jesus, e perceberam que Ele era quem verdadeiramente cumpria a Lei.Jesus e seu estilo de vida são a melhor forma de viver e cumprir a Lei de Deus (5,17-19).
Essas comunidades enfrentavam muitas dificuldades: leitura muito apegada a letra da Lei (5,17-48); uma piedade falsa (6,1-8); apego ao bem estar e ao conforto(6,19-24); profetismo falso (7,15-20); rixas entre judeus-cristãos e cristãos não judeus (8,5-13); os que falavam de paz, mas eram falsos e medrosos (10,34-36); brigas pelo poder dentro da comunidade (10,37-39); os escândalos (18,1-11); gente que fala de justiça, mas faz o contrário - hipocrisia (7,21-27); gente que minava a unidade da família (19,1-9); gente que vivia amedrontada com a volta de Cristo (cap. 25) e gente desanimada (28,1-10).
Diante de tantas dificuldades, as comunidades reuniram várias de suas lembranças, transmitidas pelos discípulos que conviveram com Jesus (Mateus foi um deles) e com o auxílio de alguns "mestres da Lei", seguidores de Jesus (Mt 13,52), escreveram o Evangelho segundo Mateus.
Jesus é apresentado no Evangelho como o "novo Moisés". Moisés subiu a montanha, recebeu a Lei e deu ao povo judeu. Jesus subiu a montanha, sentou-se e deu a real interpretação da Lei aos seus discípulos e discípulas – o Sermão da Montanha (caps. 5–7). É Jesus o sentido da Lei e sua Palavra não passa e não passará (5,18).
Os judeus amavam a Torah (Lei) que chamamos de Pentateuco (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio). São cinco livros. A melhor forma de ler e compreender o Evangelho de Mateus é perceber que o próprio Jesus (sua pessoa, ideias, estilo de vida, ações) é a Lei de Deus. Viver como Jesus é viver a Lei de Deus.
Para ler com mais facilidade e vivenciarmos a Palavra do Mestre, também dividimos o Evangelho de Mateus em5 partes:
1. Prólogo: Narrativas da infância de Jesus (caps. 1–2)
2. Jesus na Galileia (caps. 4,12–13,58)
3. Jesus, o Messias (caps. 14–20)
4. Jesus em Jerusalém (caps. 21–25)
5. Epílogo: Morte e ressurreição de Jesus (caps. 26–28).
É importante perceber que as comunidades de Mateus conheciam a experiência das comunidades de Paulo, Marcos e Lucas. Essa experiência foi fundamental para que elas redescobrissem a força de Jesus, não se fechando num gueto cristão. Compreenderam que o exemplo de Jesus formava sua verdadeira vocação e descobriram que o Pai escuta os cansados, pequeninos e miseráveis, revelando o seu plano de amor (11,25-27).
Por fim, em Mateus vemos que é Jesus o Cristo, o novo Moisés, a Lei, a Palavra, o exemplo, a força, a razão de ser e viver, o dinamismo, o Mestre, a Paz e o sentido da vida dos discípulos e discípulas de todos os tempos.
Pe. Demetrius dos Santos Silva
Biblista e docente do Curso Diocesano de Teologia