“Eu te constituí como luz das nações para levares a salvação até os confins da terra” (At 13,47)
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Quem é o meu próximo?

Publicado em 8 de julho de 2016 - 14:55:37

Quem é o meu próximo?

Esta é a pergunta que um mestre da lei fez a Jesus. Em resposta, Jesus contou a parábola do “Bom Samaritano”, lida na Missa deste domingo - Lc 10, 25-37. Certo homem, que descia de Jerusalém a Jericó, foi roubado, ferido e deixado à beira da estrada quase morto. Um sacerdote descia, viu a vítima, mas desviou-se para o outro lado da estrada e seguiu adiante. Em seguida, vinha um levita, servidor do templo, e procedeu do mesmo modo. Depois, descia um samaritano, isto é, um estrangeiro que nem sequer pertencia ao povo escolhido, de quem se podia esperar coisa pior. Mas esse desprezível samaritano viu o ferido, aproximou-se dele e teve compaixão. Então, apeou do cavalo, desinfetou as suas feridas com vinho e azeite e cobriu-as com panos. Depois o montou no cavalo e o levou à hospedaria, cuidando dele até o dia seguinte. Prosseguindo viagem, o samaritano pagou com duas moedas de prata o dono da pensão e pediu-lhe que cuidasse dele até à sua volta, quando pagaria gastos a mais. Fechando a história, Jesus perguntou ao mestre da lei: “Qual dos três foi o próximo deste homem?” Ele respondeu: “Aquele que usou de misericórdia para com ele”. Então, Jesus lhe disse: “Vai e faze a mesma coisa”. Sem dizer ao mestre da lei que a sua pergunta poderia parecer marota, Jesus deixou claro que o próximo não é só o outro que está diante de mim, mas o próximo sou eu diante do outro. Por isso, importa saber de quem é que eu, seletivamente, me faço próximo, só dos amigos, das pessoas de quem gosto ou amo, ou também dos feridos, pobres e excluídos? Em razão dessas escolhas e seus motivos é que a minha grandeza e valor serão avaliados no céu e na terra.

São quatro os verbos importantes da parábola: Ver, aproximar-se, compadecer-se e cuidar. No mistério da Encarnação, o Filho de Deus se fez carne para morar entre os humanos, os vir feridos de morte pelo pecado e se compadeceu deles, os amou até o fim e lhes deu uma vida nova e plena.

O verdadeiro cristão é um bom samaritano que anda pela vida atento aos feridos da sociedade, deles não desvia o rosto, passando ao largo pelo outro lado das vielas, ruas e estradas, mas deles se aproxima com compaixão e usa de misericórdia para servi-los, sem nada ambicionar.

A marca do cristão e da Igreja de Cristo é a misericórdia. Só quem ama merece crédito. É o que nos diz o Papa Francisco: “A credibilidade da Igreja passa pela estrada do amor misericordioso e compassivo” (O rosto da Misericórdia, 10).

Ouvi, ontem à noite pela TV, de um intelectual admirável, que muito aprecio, mas para minha surpresa, que com o tempo ele perdeu a fé e não mais acredita na vida após a morte. Disse ainda que não faz diferença ser ateu ou crente; ser uma coisa ou outra não piora nem melhora o mundo. O que importa é ser pessoa séria, responsável e que ame a humanidade. Toma a história para argumentar que crimes hediondos foram cometidos em igual proporção tanto por ateus quanto por quem dizia ter a fé. A diferença é que o crente faz o bem aos outros por amor a Deus e o ateu o faz por amor ao próprio homem. Sem explicitar verbalmente, mas é perfeitamente dedutível, esse nosso intelectual diz ser, e eu não duvido que o seja, tão ético e bom hoje como quando tinha fé em Deus, porque sua norma de vida é fazer tudo com amor. A crítica filosófica que alguém lhe faria, a qual conhece melhor do que nós, é que ele seria um típico exemplo de filho do iluminismo racionalista que edificou o humanismo sem Deus da modernidade. Mas quem sou eu para argumentar com ele, uma vez que é um eminente historiador e filósofo? Se lhe lembrasse, segundo li, que o mal da modernidade foi ter elevado o conhecimento e as invenções modernas com as parafernálias das ferramentas técnico-científicas em antídoto à crença em Deus, pois a ciência e a técnica proporcionariam a absoluta autossuficiência ao ser humano, ele daria risada, dizendo que não crê nessa baboseira.

Eu só posso falar a partir do Catecismo, que o nosso intelectual conhece muito bem, e eu pretendo conhecê-lo sempre mais. Os mandamentos da lei de Deus começam com o mandamento de base: amar a Deus acima de todas as coisas é o primeiro mandamento, e o segundo, igual ao primeiro, é amar o próximo como a si mesmo. Todo ateu diria estar cumprindo o mandamento mais importante ao menos no tocante ao amor ao próximo. Exatamente aqui é que está a idolatria, expressão da arrogância e orgulho humanos. Idolatria não é simplesmente adorar imagens, ídolos. É substituir o Deus transcendente, eterno, bom, criador e origem de tudo, por coisas ou humanos aos quais se adoraria confiando que estes ídolos realizariam nossos sonhos e nos tornariam iguais a Deus. A crença de que o homem não precisa de Deus e se basta a si mesmo está na base de toda idolatria. É a orgulhosa pretensão do diabo que queria ser igual a Deus, não o conseguindo, porém, se revoltou. O pecado original, que vem de nossos pais Adão e Eva, é o pecado do orgulho, do querer ser como Deus. No primeiro mandamento, o mais importante, por isso vem antes de tudo e de todas as coisas, é o amor a Deus, como reconhecimento humilde de que somos criaturas. O mandamento que se junta a ele, porque lhe é igual, é na verdade segundo, isto é, vem depois. Pois a adoração só a Deus é devida, e não ao homem, que não passa de criatura ainda que feita à sua imagem e semelhança. Abraão, nosso pai na fé, fez a experiência de Deus como o Eterno diante do qual se sentia “pó e cinza”. São Francisco sentiu Deus como o Criador de tudo e, deixou-nos essa belíssima oração: “Quem sois vós, Senhor, e quem sou eu? Vós, o Criador de todas as coisas e eu um vermezinho, ínfimo servo vosso”. Em razão disso ele humildemente louvava a Deus com estas palavras: “Altíssimo, onipotente e bom Senhor, a Vós o louvor, a honra, o poder e a glória, agora e para sempre. Amém”. Amar o próximo por causa de Deus é diferente do que amá-lo como um fim em si mesmo.

 

Dom Caetano Ferrari
Bispo de Bauru

 

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